domingo, 31 de maio de 2009

Zé Miguel Wisnik


Fui com Maria. Anos não pisava na Reitoria ( a ultima vez foi para ocupá-la, em 75), revi figurinhas que a frequentavam naquela época. O reitor, mais careca e mais cabeludo que dantes, meu contemporâneo. Carlinhos Cor das Águas, colega de ginásio. Paulo Costa Lima, o maestro que abandonou nossa turma de medicina no primeiro ano, para migrar para a música. Abertura/saudação com os irmãos Robato, em peças de flauta e clarineta. Zé Miguel. Quem conhece, sabe do que estou falando, quem não o conhece, corra na próxima oportunidade. Bem que podiamos ter articulado um encontro dos blogueiros naquele lugar. Falamos disto, eu e Maria, depois foi só tietagem.

A ultima vez que estive com Miguel, foi no Teatro Vila Velha para ouvi-lo sobre O Olhar: o Sentido da Paixão. Agora foi uma aula show. Show de bola. Miguel é o máximo. Bonito, simpaticíssimo, sedutor, capaz de falar horas sem cansar ninguem. Ninguem ousa interrompê-lo, nem mesmo uma chata que resolveu aparecer com uma criança de um ano. Tom Zé, Gregório de Matos, Caetano, Jorge Mautner, Caymmi, Viníciua & Tom. Pixinguinha tambem compareceu. Fiquei em estado de graça. Imaginem Maria quando, ao apresentar Coqueiros de Itapuã ele disse com aquela dicção perfeita e arrastada, em todas as letras. -"Esta música é dedicada à Maria Sampaio". O rabo-de-cavalo do Reitor quase cai. Todas as mulheres se voltaram para ela que, aos prantos, jogava beijos para um emocionado Miguel.

Depois da aula fomos vê-lo. Disse que estava feliz com a presença da gente. Eu fiquei abestado. Maria ainda roubou um pãozinho e com a desculpa de cuspir a miséra, rodou a cochia da Reitoria de tesourinha na mão catando um rabo-de-cavalo ridículo pra podar no pé.


foto de zémiguelwisnick do blogue brasilpensarte.blogspot.com, sem referencia do autor.

quinta-feira, 28 de maio de 2009

A van dos insensatos.


Por conta de um acerto familiar, fiquei sem carro ontem. Fui trabalhar de Topic. Aqui, toda van é Topic, assim como existem Gilete, Modess, Miss e Fátima. Azul marinho. Parou pra me pegar e depois, a cada cem metros para catar os desavisados. Descobri que desavisado sou eu. Todo mundo já está na onda da Topic. Dez lugares, fui o 13º e depois entraram mais cinco. Só não entrou mais porque EU bradei! ninguem mais, e ainda me olharam atravessado. Chovia, todos os vidros fechados. Nos dois assentos dianteiros, três gatinhas faziam charme pro motorista que às vezes olhava pra pista. O segundo banco é o pior porque é onde fica a porta ; o movimento alí é intenso. Eu fiquei no terceiro banco e atrás tinha mais um. Entre os bancos, passageiros em pé. Numa Topic! Quem salta, anda uns cem metros curvado e vai desempenando aos poucos. O trecho Ituberá-Valença que faço em quarenta minutos, espichou por intermináveis noventa.
Frases entreouvidas na viagem ao inferno:

"- ...o motorista vai ter de me botar na porta da clínica, porque da chuva" (aqui não se diz por causa, nem a pau!)
"- Quem não vai ver Bruno & Marrone no São João?"
"- ...foi só pegar no queixinho dela que se abriu toda!"
"- Tem dois real aí?"
"-...o doutor de Topic? huuum, sei não!..."
"- Meu sonho é ser apresentador de pograma de auditóro, que nem Raul Gil. Semana passada fiz uma presença lá na igreja e os pessoal adorou"
"- Tira o pé do bolso, motor, que tô atrasada"
"- Vai fazer o que em Valença?"
"-...aqui vende uma carne de fumeiro da boa"
"-Olhe o ponto aí, motor!"
"-Aqui tá bom pra mim"

Depois, foi só o silêncio. Entendi porque Raul me diz que em Cruz das Almas o povo chama Topic de Trupício. Sério!

foto da stropício, sem identificação do autor

quarta-feira, 27 de maio de 2009

Valença


Desde que meu irmão foi assassinado em Valença que aquela cidade morreu pra mim. Eu matei Valença. Só a uso de passagem para a Bahia de 15 em 15 dias. Mas a vida dá voltas. Desde que saí de Camamu estou trabalhando lá. No mesmo dia em que pedi exoneração, duas Clínicas me convidaram e lá estou, todos os dias, queimando minha língua. Preconceito besta, mesmo porque a cidade não tem nada a ver com o que aconteceu. Quem matou meu irmão provavelmente mora lá e a cidade o acolhe como me acolheu. Só espero que alguns, também acolhidos, o mandem para a cadeia. Que apodreça numa cela da cidade de Valença, na sua passagem para o inferno. Quanto a mim, continuo trabalhando, gostando devagarinho da cidade e de passagem para Bom Despacho.

No próximo dia 2 de junho completam dois anos do assassinato de Eduardo.
foto de valença de bernardo,em 27/05/09

segunda-feira, 25 de maio de 2009

Lá vem forró!


Pra quem mora no interior (e pra vocês também), chegou o momento: é hora do forró. Atualmente é a festa que mais gosto. Eu, carnavalesco maior, de brincar os quatro dias ( eram quatro!) no Relógio de S. Pedro e quatro noites no Fantoches, há muito abandonei o reinado de Momo. Pipoca não se conforma com camarote.

Agora vem o pior: as festas juninas estão cada vez mais globalizadas no sentido do axé. Aqui em Ituberá, este ano, a grande atração do S.João, pasmem, é a dupla Bruno & Marrone. S. João, festa da cidade, Natal, carnaval, é tudo na base do oxente-music. Ontem vi o cartaz da festa com as outras atrações: forró universitário (?!), forró progressista (?!) e pornoforró. Calçola Preta. Cacau com não sei o que. Chiclete com Banana. Nada com coisa alguma. Forró que é bom mesmo, nada. Inventaram até que o forró de mesmo se chama forró pé de serra. Pra mim forró é forró simplesmente, o resto é que precisa de outro nome pra dizer que é "forró". E olhe que tem um pessoal aí que faz um forrozinho da melhor qualidade. Adorei o show de Adelmário Coelho ano passado que conseguimos pra cantar em Nilo.

É o período que recebo meus amigos e parentes em visita. Se permanecer por aqui, de minha casa ouvirei de longe a dupla que "dormiu na praça, pensando nela". Caso contrário vou arrebanhar todo mundo e me mudar temporariamente para um pé de serra qualquer. Até que venha o S. Pedro do Arrocha.
ilustração: quadro de volpi

sexta-feira, 22 de maio de 2009

Minha primeira noite


1957.

Chegamos à fazenda na boquinha da noite, posso estar enganado, não sei se pelo defeito na visão descoberto anos mais tarde ou se as crianças lembram de tudo meio escuro mesmo. A caminhonete estacionou na porta da frente, aberta com uma chave de uns 15 centímetros. De repente um bando ( socorro, coletivo de morcegos, rápido!) de morcegos fez uma revoada sobre nós. Eram muitos, muitos mesmo, uma coisa assustadora para crianças da cidade que sonharam ir morar na fazenda. Cadê os encantos? A porta rangiu, uns morcegos retardados passaram e o interior da casa tinha um cheiro ( novamente o cheiro...) que nunca esqueci. Pensem em dezenas de sovacos de morcegos. O chão, um tapete de cocô de morcego. No forro da escada, uns dois dormiam sem sacar que a galera tinha vazado. Ficaram alí até quando minha lembrança alcança. Sobrou pra minha mãe ( a empregada ainda vomitava pela viagem de barco): limpar a casa de 300 m² que ela jamais vira antes, cuidar do marido doente, cuidar de cinco filhos, fazer comida, desarrumar os baús, forrar camas, acender os candeeiros, providenciar velas, botar penicos embaixo das camas, tirar água do porrão pra moringa, lavar banheiro, tanger morcegos, consolar os filhos e convencê-los de que um dia ainda iriam gostar dali.

1985.
Meu pai vendeu a fazenda. Nós, os filhos, sofremos muito porque aprendemos a amar aquele lugar. Alguem pergunta a minha mãe:
-"Vai sentir saudades?"
-"Não".

foto:geocities.com

quinta-feira, 21 de maio de 2009

Cairú


1957. No cais da Bahia, embarcam no saveiro Cairú (assim grafado no casco) de Seu Aurélio, meu pai, minha mãe, cinco dos seis filhos ( o sexto viria depois), Valdete, a babá de Leonardo, cachorro, galinha, papagaio, baús e mais baús com as traquitanas e mucufaias de uma vida, e uma caminhonete inglesa aos cuidados de Edgar Rogaciano, motorista cedido por tio Mirabeau. Destino: Nilo Peçanha, Fazenda Mutumpiranga. Para sempre. Mudança radical. Meu pai, depois da aviação e uma construtora, passou a agricultor, de piaçava.

A viagem de 24 horas foi um inferno, com uma calmaria de meio dia na barra do Morro, meu pai doente, queimando de febre, minha mãe apavorada com a mudança, os marinheiros convencendo facilmente os meninos que o barco estava arrodeado de baleias e tubarões e que iríamos afundar a qualquer momento com o peso do carro. Lembro do cheiro de vômito. Valdete, sergipana da caatinga, faltou vomitar a alma.

Desembarque no cais de Taperoá, com muitos homens empurrando e puxando o carro por uma prancha e outros tantos olhando e agourando: -"vai cair...vai cair..."

Não caiu. Chegamos à fazenda onde moramos até 1985. A casa, tá na foto do post anterior.

Quanto a mim, sete anos de psicanálise resolveram meu pavor de viagens.


foto do barco cairú cedido por lelo,filho de seu aurélio

quarta-feira, 20 de maio de 2009

Minha casa






"Cada talba que caía, doía no coração".


Toda vez que ouço esta música de Adoniran Barbosa, fico melancólico. A história é triste porque eu, Matogrosso e o Joca ficamos sem casa. Os homi mandou derrubar.

Hoje passei por minha antiga casa. Todo dia eu passo mas viro o olhar pro outro lado. Hoje resolvi encarar. Parei o carro e fiz a foto acima. Em casa, comparei com a qui de donde nóis passemo dias feliz de nossas vida. Já tem pranta no teiado, mato tomou conta. Sou muito chorão mas hoje me superei. Chorei ali mesmo no acostamento, com a máquina grudada na cara.

Amanhã eu vorto com menos tristeza.

Saudosa Maloca.

foto de bernardo em 20.05.09

quinta-feira, 14 de maio de 2009

Papas


Tenho uma relação especial com os Papas. Adoro as histórias sobre os antigos, muitas cabeludas outras escabrosas, os bastidores daquela eleição que deve ser uma coisa, com o "espírito santo" descendo para indicar o escolhido.

Tinha uma simpatia por João XXIII, com aquela cara de avô bonzinho. Nem sei se foi um bom Papa (pra quem?). Pio IX virou doce. Dizem ( foi do tempo de Maria) que Pio XII era um tirano e que andou fechando os olhos pras bandalheiras nazistas e fascistas. Paulo VI foi um chato. JP I, parece que ia dar um caldo, aí deram um nele. Quando apareceu JP II, caí de amores, fui ver ele na avenida tenho até um filho xará ( ele, o Papa, morreu sem saber que não foi por causa dele, foi coincidência) .

Foram 264 desde Simão Pedro e teve um, Bento IX, que adorava ser Papa: foi por três vezes! Teve Papa Bórgia ( irmão da Lucrécia), Pio, Leão, Xisto, Clemente, tivemos dois Papas de uma vez, período sem Papa, de um tudo um pouco. Um morreu na cadeia, nove foram assassinados, dois feridos em revoltas e um morreu com o teto que desabou em cima.

Como a Igreja é bem velhinha, parece que o espírito santo tá meio ceguinho, digo por causa desta ultima escolha. Acho que quando ele chegou, ( o pombo, e deve ser por aquela chaminé), rodou, rodou, cansou, ia dar uma paradinha, daí os cardeais naqueles vestidos impecáveis, calor desgraçado, fome, vontade de fazer xixi, cansados e doidos pra acabar com aquilo, bradaram:

-"É ele, é ele!!" O santo pombo estava pousando na cabeça do Ratzinger. Mas era só pra dar uma cagadinha.


foto da web,sem crédito

quarta-feira, 13 de maio de 2009

Chupa-imbigo



Assim mesmo, com "i" é como aqui no interior chamam o umbigo. E o Chupa-imbigo é o maior inimigo das crianças. Parece ter sido invenção dos pais, versão regional para o bicho-papão, na hora de ameaçar os filhos para não fazerem aquilo que os pais não querem que façam. Chamam o Chupa-imbigo como quem pedem socorro a um super-herói, se a criança não quer se levantar cedo pra ir pra escola, pra tomar o café todo, pra ir pra escola, pra sair da escola, pra ir tomar banho, pra sair do banheiro, parar de brincar na rua de noite.


Por aqui andava uma Kombi preta com letras amarelas, de algum órgão federal, que era acionada nas campanhas de vacina. Tempos de vacina obrigatória contra a varíola em que os agentes do mal ficavam espetando os bracinhos da gente com um alfinete molhado numa gosma, ou com um vidrinho que arranhava e que já vinha com a gosminha dentro, provocando pústulas terríveis perto do muque. A vingança da molecada veio de 4 rodas: todo carro preto era a Kombi e a Kombi era do Chupa-imbigo! Inimigo! Quando ela aparecia, mato pra que te quero! Imaginar alguém lhe sorvendo a vida pelo imbigo, era matéria para Tortura Nunca Mais.


Minha ultima ação na Secretaria de Saúde de Camamu foi a campanha de vacinação contra gripe para o idoso. Atingimos indice baixíssimo de cobertura e agora teremos de ir atrás, de casa em casa, buscando vovôs e vovós para tomarem vacina, até no mato, se for o caso. Sinal dos tempos: Chupa-imbigo agora anda de Mitsubishi L 200. Preta.


foto:chupa-imbigo, acrílico, blogdorodrigotavares.

terça-feira, 12 de maio de 2009

Of.01/09

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Exmª Srª Prefeita
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Chega. Peço exoneração.
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Atenciosamente,
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.Bernardo Guimarães
Ex-Secretário de Saude
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sábado, 9 de maio de 2009

Perfume


Tenho uma excelente memória olfativa. As outras, o alemão anda tentando apagar. Veremos. Li o ultimo Monólogo de Edu escrito nas Madrugadas, que me fez lembrar " do tempo em que éramos lindos"*. Lembrei da escola primária em Nilo, ao recordar o cheiro da merenda: pão com manteiga e açucar na merendeira de plástico. Já cheirei pão com manteiga e açucar sem o plástico e não é a mesma coisa.
Das lembranças de quando "era bem lindo mesmo", a da primeira paixão me veio com o texto de Edu. Devia estar com sete, oito anos porque com dez deixei Nilo pra estudar na Bahia e já estava no segundo e definitivo amor, de tantos outros que vieram. Minha namorada, em quem jamais encostei um dedo sequer, usava um perfume que a identificava a quilometros. Hoje percebo que minha função como namorado, era catar seu cheiro onde passava, tocava, pisava. Domingo, da porta da Igreja já sabia se estava lá. E o ódio cheio de ciúmes quando sentia aquele cheiro em algum amigo? Três dias sem dormir. Até hoje, manopla de bicicleta tem aquele cheiro, daquele perfume que ela deixou na minha.

Passei anos com a lembrança daquele perfume. Cafunguei cangotes à toa; pra que, não sei, acho que só pela lembrança. Se tornou uma obsessão reencontrar o perfume.

Dia desses, numa prosaica compra de pregos para pendurar uns quadros, uma senhora, certamente da roça, com seu lencinho na cabeça e sandálias havaianas, encostou em mim. A labirintite voltou. Era ele, o perfume, sem a menor dúvida eu o reconheceria em qualquer vida. Fiquei ali, nem olhei pros lados, muito menos perguntei alguma coisa. Só fiquei ali, por quase cinquenta anos, olhando pra outro lugar...
* expressão cunhada por Maria Sampaio e Luciano Freitas para se evitar o horrível " antigamente..."
foto: perfumedegardenia.com.br

quinta-feira, 7 de maio de 2009

Chove, chuva


Antigamente, na minha terra, chovia mais de duzentos dias por ano! Bons tempos, aqueles, em que nem se desconfiava do aquecimento do planeta. E tome-lhe a desmatar! Resultado: hoje ficamos até noventa dias sem ver uma gota de água caindo dos céus.

Naqueles tempos de chuvas fartas, a gente morava na fazenda. A casa, no alto de um morro todo cercado por dois rios. "-Tomara que chova três dias sem parar". A gente cantava e repetia, repetia como um mantra, a água descia aos baldes, os rios transbordavam, a casa ficava ilhada; resultado: além de acreditar que tínhamos o poder de fazer chover, ganhávamos alguns dias sem aulas. Enchentes. Dava pra nadar nas enchentes, não se falava também de leptospirose. No máximo uma cobra tentando se salvar e a gente dava uma mãozinha, ou uma varinha pra ela, coitada. Jangada de toros de bananeiras. Chuva, enchente, farra. Não tenho mais isso. Não deixo Iara se aproximar da varanda em dia de chuva. Que saco! Me perdi lá atrás e fiquei besta. Tenho medo de chuva, fico pensando em quem mora nas beiradas dos morros da Bahia. Chuva, enchente, morte. Que saco! o mundo mudou muito e mudou tão devagarinho que só agora me dou conta de que eu era feliz e não sabia...
foto:dpmablog.wordpress

segunda-feira, 4 de maio de 2009

BaVi


Luto. Três dias. Perdemos mais um campeonato. Quem não entende, não dê palpite. Quem torce pro Vitorinha, não me provoque porque sou ferrado.

Adeus.

xeudizer:

anotações livres, leves, soltas