
Trabalho em Valença todos os dias, o dia todo. Ando 90 km pra ir e voltar, daí pensei na possibilidade de morar por lá. Por que não? Descobri, na verdade, que eu queria mesmo era comprar uma casa velha e reformar todinha, coisa que mais gosto na vida, depois de cafuné. Sou um construtor nato e adoro dar esporro em pedreiro, porque eles só querem fazer o que dá na telha lá deles; nossas idéias são sempre extravagantes, exóticas e nunca se encaixam nos padrões arquitetônicos deles.
Pronto. Passei a andar pela cidade, olhando tudo quanto é casa velha que me aparecia na frente, até que me bati com "a casa"! Fica na entrada da cidade, no topo de um morro, no meio de um pasto, totalmente nascente, árvores sombreando, calçamento em torno da casa, dois pavimentos, uma beleza. A placa de "vende-se" me convidou a entrar. Estacionei e o moço que consertava o jardim se dirigiu a mim.
-" O senhor quer comprar a casa?"
-" Me interessei, de repente...com quem trato?"
-"O telefone da placa. Mas o senhor tem certeza de que quer comprar esta casa?"
Comecei a achar que tinha coisa. Malassombrada? Não tinha pinta de que ia desabar. Falta água? é longe da cidade?
-"Por que a pergunta?"
-" Tô vendo que o senhor não é daqui. Isto aqui é o puteiro da cidade. As meninas estão lá em cima."
Me interessei mais ainda e subi. Uma japonesinha, uma magricela e a gerente que fazia chapinha me conduziram ao tour pela casa. Só isso, vou avisando!
A casa é uma horror de mal dividida, cheia de quartinhos, óbvio, e o mais interessante: as pinturas pelas paredes! Mulheres nuas, em posições que não sei como alguem pode achar excitantes, feitas com spray de tinta fosforecente. Nunca vi tanta xoxota acesa na vida. Disseram que o pintor desenhou cada uma delas. Havia uma duzia ou mais de mulheres nuas nas paredes.
Na saída, as meninas curiosas e até certo ponto temerárias com a possibilidade do despejo, perguntaram cruzando os dedos:
-" E aí, vai comprar?"
Acalmei os coraçãozinhos que estavam a ponto de passar pelos batons vermelhos:
-" Gostei muito mas infelizmente não vai dar; minha mulher não vai querer porque, prá comprar, minha unica condição seria deixar as pinturas do jeito que estão".
Fui aplaudido pelas três e pelo jardineiro até lá embaixo, no portão decorado de azulejos.
gravura: quebarato.com